A Justiça estadual brasileira tem observado um crescimento significativo no número de processos relacionados ao estelionato sentimental. Esse tipo de crime ocorre quando a vítima é induzida a entregar bens ou valores sob a promessa de um relacionamento afetivo. Em 2023, foram registradas 78 decisões sobre o tema, e até junho de 2024, já foram proferidas 51 decisões, conforme levantamento do escritório Trench Rossi Watanabe.
As vítimas, geralmente, buscam reparação por danos materiais e morais. O tema ganhou destaque após casos como o “golpe do Tinder”, onde criminosos atraem vítimas por aplicativos de relacionamento e esvaziam suas contas bancárias via transações Pix. A expectativa é que o número de decisões sobre estelionato sentimental ultrapasse 100 até o final de 2024, um aumento de 28% em relação ao ano anterior.
A advogada Fernanda Las Casas, do Instituto Brasileiro de Direito de Família (Ibdfam), aponta que esses casos são mais comuns entre mulheres financeiramente estáveis que buscam relacionamentos online. Muitas vezes, os golpistas inventam emergências para pedir dinheiro, alegando problemas de saúde ou a necessidade de limpar o nome antes de casar.
Atualmente, o estelionato sentimental é tratado como uma modalidade do crime de estelionato, previsto no artigo 171 do Código Penal, com penas que variam de 1 a 5 anos de reclusão. Um projeto de lei (PL nº 6444/2019) busca tipificar especificamente esse crime, mas ainda aguarda apreciação no Senado.
O número de registros de estelionato em geral também aumentou, atingindo cerca de 1,9 milhão de ocorrências em 2023, um crescimento de 8,2% em relação a 2022. As advogadas Fernanda Haddad e Giuliana Schunck, do Trench Rossi Watanabe, destacam que muitas vítimas sentem vergonha e demoram a agir, o que dificulta a obtenção de provas.
Para combater essa prática, é essencial que as vítimas façam boletins de ocorrência, preservem mensagens e áudios e busquem orientação jurídica. A aplicação do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), tem sido uma ferramenta importante para tratar esses casos com a devida sensibilidade.
Em um caso recente, o juiz Gilberto Schafer, de Porto Alegre, utilizou a Lei Maria da Penha para desfazer uma sociedade entre uma mulher e um golpista. A mulher havia contraído empréstimos de cerca de R$ 1 milhão para investir na empresa do “noivo”, que conheceu em um aplicativo de relacionamento.
Outro caso, julgado em Santa Catarina, resultou em indenização de
12,9milpordanosmateriaiseR 5 mil por danos morais. A vítima, que conheceu o golpista nas redes sociais, descobriu que ele não era policial rodoviário federal e mantinha outras relações, além de já ter lesado outras mulheres.