A Constituição Federal de 1988, ao estabelecer os pilares do Estado Democrático de Direito, delineia direitos fundamentais que visam assegurar a dignidade da pessoa humana e a justiça social. Entre esses direitos, destaca-se o princípio da boa administração pública, que, embora não explicitamente mencionado, é essencial para a efetivação dos direitos sociais e individuais. Este princípio implica que o Estado deve atuar de forma eficiente, transparente e responsável, garantindo que os recursos públicos sejam utilizados de maneira a promover o bem-estar coletivo. A ausência de uma referência direta a um “direito fundamental ao bom governo” não diminui sua importância; pelo contrário, reforça a necessidade de uma interpretação dinâmica da Constituição, capaz de adaptar-se às demandas sociais contemporâneas.
A ideia de um direito fundamental ao bom governo encontra respaldo na teoria constitucional contemporânea, que advoga por uma Constituição aberta e evolutiva. Segundo essa perspectiva, a Constituição não se limita ao texto literal, mas deve ser interpretada à luz das transformações sociais, políticas e econômicas. Essa interpretação dinâmica permite que princípios implícitos, como o da boa administração, sejam reconhecidos e aplicados, mesmo na ausência de previsão expressa. Dessa forma, a Constituição de 1988, ao ser compreendida como um documento vivo, capaz de responder às necessidades da sociedade, legitima a exigência de um governo eficiente e responsável como um direito fundamental dos cidadãos.
A concretização desse direito fundamental ao bom governo exige a atuação coordenada dos três Poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário. O Executivo, responsável pela implementação das políticas públicas, deve garantir que os serviços prestados à população sejam de qualidade e atendam às necessidades da sociedade. O Legislativo, por sua vez, tem o papel de fiscalizar as ações do Executivo, elaborar leis que promovam o bem comum e assegurar que os recursos públicos sejam aplicados de forma justa e eficiente. O Judiciário, além de assegurar a legalidade dos atos administrativos, deve atuar como um guardião dos direitos fundamentais, garantindo que o Estado cumpra sua função de boa administração.
Além da atuação dos Poderes, a sociedade civil desempenha um papel crucial na promoção do bom governo. A participação ativa dos cidadãos, por meio de mecanismos como audiências públicas, conselhos de políticas públicas e o direito de petição, fortalece a democracia e assegura que as políticas públicas reflitam as reais necessidades da população. A transparência na gestão pública e o acesso à informação são fundamentais para que os cidadãos possam exercer seu direito de controle social, contribuindo para a melhoria da administração pública e para a efetivação do direito fundamental ao bom governo.
A jurisprudência dos tribunais superiores tem reconhecido a importância do princípio da boa administração pública. Decisões do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça têm reforçado a necessidade de que a administração pública atue com eficiência, transparência e respeito aos direitos dos cidadãos. Esse reconhecimento judicial contribui para a consolidação do direito fundamental ao bom governo, ao estabelecer parâmetros para a atuação estatal e ao assegurar que os cidadãos possam exigir a efetivação desse direito.
A implementação de políticas públicas que promovam a boa administração é essencial para a concretização desse direito. A adoção de práticas de gestão pública baseadas em resultados, a utilização de tecnologias da informação para melhorar a prestação de serviços e a capacitação contínua dos servidores públicos são medidas que contribuem para a eficiência da administração pública. Além disso, a avaliação constante das políticas públicas, por meio de indicadores de desempenho e auditorias independentes, permite identificar falhas e implementar melhorias, assegurando que os recursos públicos sejam utilizados de forma eficaz e que os direitos dos cidadãos sejam respeitados.
O reconhecimento do direito fundamental ao bom governo também implica a responsabilização dos gestores públicos. Mecanismos de controle interno e externo, como tribunais de contas, controladorias e o Ministério Público, desempenham um papel essencial na fiscalização da aplicação dos recursos públicos e na prevenção de atos de improbidade administrativa. A responsabilização efetiva dos gestores públicos, por meio de processos administrativos e judiciais, é fundamental para garantir que a administração pública atue em conformidade com os princípios constitucionais e para assegurar que os cidadãos possam confiar na gestão pública.
Em conclusão, embora a Constituição de 1988 não mencione explicitamente um direito fundamental ao bom governo, a interpretação dinâmica e evolutiva de seus princípios permite reconhecer esse direito como implícito. A efetivação desse direito requer a atuação coordenada dos três Poderes, a participação ativa da sociedade civil, o reconhecimento judicial da importância da boa administração pública, a implementação de políticas públicas eficientes e a responsabilização dos gestores públicos. Somente por meio dessas ações será possível garantir que o Estado atue de forma a promover o bem-estar coletivo e assegurar a dignidade da pessoa humana, pilares fundamentais da Constituição de 1988.
Autor: Emma Willians